27.3.18
#4 ~ VH faria hoje 30 anos
No passado dia 8 houve uma notícia que fixou particularmente a minha atenção por se tratar da morte de um escritor com o qual partilho o mesmo ano de nascimento, distando de menos de um mês entre cada um de nós ter vindo ao mundo. O escritor em questão é Victor Heringer, natural do Rio de Janeiro.
Apesar de, à data da sua partida, não conhecer a sua escrita, uma vez que não está publicado em Portugal, o seu nome era me familiar pois já tinha ouvido falar do seu mais recente romance – O Amor dos Homens Avulsos - em canais brasileiros no Youtube.
Como leitora ávida e amante inveterada de literatura, a trágica notícia do seu falecimento levou-me a procurar mais informação sobre a sua pessoa e a sua obra. Poeta, ficcionista, cronista, ensaísta e artista visual, um menino multifacetado e com um talento sem fim, e reconhecido desde cedo pela crítica.
Na senda por lê-lo, comecei por procurar o que dele está disponível pela internet. Comecei por ler seu blog e instantaneamente me apaixonei e identifiquei com a sua escrita.
Entretanto, comprei o conto Lígia, em versão digital, bem como o e-book O Amor dos Homens Avulsos na loja online da Saraiva (uma cadeia de livrarias do Brasil). Ainda que prefira livros físicos, esta era a única forma de ter acesso à literatura de Heringer.
Já li ambos, e a paixão incendiada pela escrita no blog do autor tornou-se amor incondicional depois de terminar a leitura do conto e do romance.
Toda a restante obra de Victor Heringer está esgotada no Brasil, logo duvido que eu algum dia consiga lê-la, o que me entristece. Quem dera que a obra dele fosse republicada, e que fosse publicada também em Portugal.
Victor Heringer deixou este mundo cedo demais. As causas da sua morte são desconhecidas, e a situação em que ele foi encontrado deixa questões em aberto, mas uma coisa é certa, como disse o próprio autor
"vou morrer / depois do começo e bem antes do fim"
E o panorama literário contemporâneo do Brasil – do mundo – fica indubitavelmente mais pobre. Que este começo perdure infinitamente que a sua beleza é incomum.
Diamantes raros, mas indestrutíveis.
Victor Heringer faria hoje 30 anos.
Ele continua vivo através da sua obra.
Parabéns Victor.
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victor heringer
21.3.18
#3 ~ Mesa dos Sonhos
Ao lado do homem vou crescendo
Defendo-me da morte quando dou
Meu corpo ao seu desejo violento
E lhe devoro o corpo lentamente
Mesa dos sonhos no meu corpo vivem
Todas as formas e começam
Todas as vidas
Ao lado do homem vou crescendo
E defendo-me da morte povoando
De novos sonhos a vida
~ Alexandre O'Neill
21 de Março, Dia Mundial da Poesia
Defendo-me da morte quando dou
Meu corpo ao seu desejo violento
E lhe devoro o corpo lentamente
Mesa dos sonhos no meu corpo vivem
Todas as formas e começam
Todas as vidas
Ao lado do homem vou crescendo
E defendo-me da morte povoando
De novos sonhos a vida
~ Alexandre O'Neill
21 de Março, Dia Mundial da Poesia
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13.3.18
#2 ~ Alérgico ma non troppo
esperando a sagrada família
quando eu morrer cedo
(em verdade vos digo)
não vou ver concluída
a sagrada família
(está para dois mil e vinte e seis),
que sobrevive à mão que fez;
vai se construindo sozinha,
sem gaudí e, logo logo, sem mim.
e eu ainda estou de entremeio:
não tenho nada a ver – vou morrer
depois do começo e bem antes do fim.
imagino o que deus diria a respeito.
imagino que se vanglorie.
é o que eu faria,
se vivesse em barcelona
se tivesse um gato espanhol,
que só os gatos sabem de deus
(eu tenho alergia).
~ Victor Heringer
quando eu morrer cedo
(em verdade vos digo)
não vou ver concluída
a sagrada família
(está para dois mil e vinte e seis),
que sobrevive à mão que fez;
vai se construindo sozinha,
sem gaudí e, logo logo, sem mim.
e eu ainda estou de entremeio:
não tenho nada a ver – vou morrer
depois do começo e bem antes do fim.
imagino o que deus diria a respeito.
imagino que se vanglorie.
é o que eu faria,
se vivesse em barcelona
se tivesse um gato espanhol,
que só os gatos sabem de deus
(eu tenho alergia).
~ Victor Heringer
12.3.18
#1 ~ As Palavras Que Te Envio São Interditas
As palavras que te envio são interditas
até, meu amor, pelo halo das searas;
se alguma regressasse, nem já reconhecia
o teu nome nas suas curvas claras.
Dói-me esta água, este ar que se respira,
dói-me esta solidão de pedra escura,
estas mãos nocturnas onde aperto
os meus dias quebrados na cintura.
E a noite cresce apaixonadamente.
Nas suas margens nuas, desoladas,
cada homem tem apenas para dar
um horizonte de cidades bombardeadas.
~ Eugénio de Andrade
até, meu amor, pelo halo das searas;
se alguma regressasse, nem já reconhecia
o teu nome nas suas curvas claras.
Dói-me esta água, este ar que se respira,
dói-me esta solidão de pedra escura,
estas mãos nocturnas onde aperto
os meus dias quebrados na cintura.
E a noite cresce apaixonadamente.
Nas suas margens nuas, desoladas,
cada homem tem apenas para dar
um horizonte de cidades bombardeadas.
~ Eugénio de Andrade
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